Ao abordar o tema bitcoin não é incoerente associá-lo de alguma forma ao livro Reconhecimento de Padrões, de William Gibson, famoso pela criação da trilogia Sprawl, inspiração de Matrix – em que, em 2003, ele já especulava que a utilização de dinheiro em papel seria considerada ilegal.
Assim, ao analisar as alternativas de uso do blockchain (ou cadeia de dados) – tecnologia de registro distribuído que visa a descentralização como medida de segurança e uma forma de validar uma transação ou registro – é possível imaginar os consumidores como personagens de um enredo cyberpunk de verdade.
As possibilidades de desintermediação nesse modelo são quase infinitas, sobretudo quando associadas a outras tecnologias emergentes do mercado digital, como internet das coisas (IoT), machine learning, inteligência artificial (IA), realidade virtual e realidade aumentada, aplicadas em soluções financeiras e não financeiras.
Hoje, estão presentes nas mais diversas iniciativas globais com o objetivo de desburocratizar os sistemas, oferecer segurança, transparência e conexões diretas entre consumidores e fornecedores, população e governo, usuários e devices.
Em quase todas as transações financeiras ou de confiança, um terceiro é responsável por validar e intermediar o processo, como instituições financeiras, cartórios e autoridades certificadoras (no caso de certificados digitais), o blockchain substitui todas elas por meio da criptografia e de assinaturas com histórico de transações.
Tudo isso, por meio de um “livro-contábil” público distribuído entre os nós da rede que validam a origem, o destino e a ordem em que as transações ocorreram por meio de hashs, timestamp e recursos computacionais utilizados no processo.
Blockchain massivo
No primeiro relatório do World Ecomomic Fórum para a disrupção ou 4º revolução – Deep Shift – o blockchain está no centro dos seis grandes tópicos das mudanças, com foco principal em economia compartilhada e confiança distribuída, e prevê que até 2027 o uso do blockchain seja massivo globalmente.
De olho nesse mercado, e atento as mudanças, não só do modelo de negócio, mas da própria característica fundamental de sua existência (como a alavancagem do dinheiro, inflação e derivativos) os 70 maiores bancos do mundo formaram em 2014 o consórcio R3 Cev, com o objetivo de construir e capacitar a próxima geração de serviços financeiros como contratos inteligentes, confiança distribuída e investimento em startups de serviços financeiros.
Mas esse não é o único mercado atento ao poder do blockchain. Há desde compartilhamento de arquivos, contratos inteligentes, transparência na governabilidade à emissão de cidadania utilizando hoje a tecnologia que promete revolucionar não só a relação dos consumidores, mas a própria noção de comunidade global e divisões geopolíticas. Alguns exemplos:
Bitnation — estrutura governamental baseada em blockchain, um país na internet, capaz de oferecer serviços como cartórios, segurança baseados em análise de risco, monitoração GPS, resposta a eventos de emergências, imagens de lugares inacessíveis ou inseguros via drone, proteção e assistência médica, serviços a refugiados em parceria com a ACNUR, ACNUDH e UNPO, educação, entre outros.
Slock – fechadura inteligente, que possibilita, por exemplo, o aluguel de um quarto de hotel ou casa consultando a disponibilidade do local direto no device, efetuar a reserva e a transferência de criptomoeda diretamente à fechadura. E esta pode, por exemplo, efetuar a avaliação da sua própria funcionalidade, abrir um chamado de conserto e dividir os lucros entre os proprietários por meio de contratos inteligentes. O mesmo será possível com os carros autônomos.
Para ir além das soluções futuristas existem milhões de possibilidades práticas que dão transparência e agilidade aos processos burocráticos atuais como serviços governamentais de identificação, registro de propriedade e de novas empresas, consulta à população, decisões judiciárias, prescrições médicas, votos, pagamentos de taxas e impostos, tudo via internet, com soluções blockchain, que hoje já estão disponíveis em alguns países.
Por meio de contratos inteligentes, é possível executar automaticamente as cobranças e divisões de lucros das cláusulas de um contrato, atividade com grande aplicabilidade na indústria fonográfica e serviço de stream, por exemplo.
Da agenda do médico à carteira de motorista, do reconhecimento de assinatura ao fechamento de um contrato, do aluguel da casa à emissão de um passaporte, o blockchain pode revolucionar a vida da sociedade hoje. Avalie essas possibilidades.