Diariamente somos conectados a diferentes cenários, sejam eles pessoais ou profissionais, e por meio deles, vivemos inúmeras trocas com indivíduos singulares, com comportamentos e pensamentos únicos. O modo como nos comunicamos está diretamente ligado a maneira como as pessoas nos veem e nos interpretam. Existem vários elementos linguísticos envolvidos na comunicação que podem garantir que uma mensagem seja proferida e recepcionada satisfatoriamente.
O ato de se comunicar é uma arte e, independente do meio em que estamos inseridos, uma boa comunicação vai muito além da tentativa de transmitir uma mensagem. Como disse o poeta romano Publius Sirius, século I a.C., “Estamos interessados nos outros quando eles se interessam por nós”, e esse é justamente o ponto no qual são desencadeadas algumas problemáticas.
Imagine a seguinte situação: um novo cliente é atendido por um gerente de contratos e durante a primeira reunião de negócios o cliente solicita a proposta de um novo projeto. Durante a explicação do cliente sobre a demanda, o gerente recebe uma mensagem e em seguida uma ligação do seu superior. Pela gravidade que a situação parece ter, ele pede licença e atende a chamada. Ao retornar, recebe do cliente uma devolutiva ríspida de que a prestação de serviços não está satisfatória e que se sentiu desvalorizado pela interrupção da conversa. Incomodado pela postura enérgica do cliente, o gerente rebate: “Que tal um pouco de paciência? Ainda estou aqui para atendê-lo”. Pronto! Esse é o início de um conflito que poderia ser facilmente evitado com um ajuste de postura de ambas as partes.
Essa situação poderia ser resolvida com a utilização de técnicas da Comunicação Não-Violenta (CNV), uma abordagem que se concentra em mediar formas de comunicação dirigidas pela empatia, respeito e compreensão. Essa perspectiva, elaborada pelo psicólogo clínico Marshall Rosenberg em meados dos anos 60, compreende habilidades de ouvir e falar, apoiando a construção e a melhoria das relações interpessoais saudáveis e resolução de conflitos. Rosenberg relata em seu livro Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais, que esse método é pautado em capacitações de linguagem que colaboram para a transformação da maneira como cada um se comunica e escuta os demais. O pesquisador defende que por meio dessa abordagem, as reações aos estímulos de comunicação deixam de ser instintivas e passam a ser mais conscientes. Ele descreve os seguintes pilares para mais assertividade e compassividade durante uma conversa:
- Observação: para descrever objetivamente quaisquer fatos sem nenhum julgamento.
- Sentimentos: para trabalhar a si mesmo, conseguindo identificar e expressar as próprias emoções.
- Necessidades: para identificar as próprias carências e desejos.
- Solicitação: para ter coerência e objetividade ao fazer pedidos.
Relembrando o exemplo citado anteriormente, fica claro que utilizando os pilares desse método, seria possível inibir o ruído de comunicação e transformar um padrão negativo de pensamento do cliente em uma troca baseada em respeito mútuo, ao entender que aquela foi uma situação atípica. E o gerente, tendo empatia de entender que para ele a interrupção não foi inconveniente, mas para o cliente foi.
Ao estudar mais sobre as técnicas da CNV, me deparei com situações no meu dia a dia profissional em que pude aplicá-las e, melhor ainda, ensinar pessoas a minha volta. Atuando como líder de squads de desenvolvimento há alguns anos, sempre me baseei no processo de influenciar e motivar outras pessoas para alcançarmos um objetivo comum, motivando-as a darem o seu melhor. Apoiada na abordagem da CNV para interpretar melhor as pessoas e direcioná-las no caminho da resolução, ao liderar um time no qual duas pessoas não se entendiam, aproveitei um dos momentos de 1:1 com cada um dos envolvidos e abordei o tema da CNV, deliberando sobre sermos seres únicos, com particularidades de pensamento e comportamento, e que disso surge a imprescindível necessidade de nos tornarmos empáticos, assertivos e compreensivos durante cada interação. Aplicando os conceitos acima citados na minha abordagem e incentivando que os envolvidos também passassem a exercitá-los para que pudéssemos dissipar o clima hostil e de instabilidade que havia se instalado na equipe, juntos conseguimos enxergar mais claramente o contexto em que estávamos inseridos e a maneira ideal de estabelecer qualquer tipo de comunicação. Assim, de forma progressiva, esse entendimento foi sendo disseminado em toda squad e em pouco tempo retomamos o clima amistoso e agradável de trabalho.
A CNV é um método poderoso com inúmeros benefícios, mas necessita de exercício constante de autoconhecimento e coragem. Podemos ajudar pessoas a se comunicarem de forma clara e resolverem conflitos pacificamente para construir relacionamentos mais fortes, baseados na confiança. Se não aprendido e praticado, o mundo tende a continuar evoluindo para um ambiente onde trocamos a resolução de conflitos por agressões gratuitas, como diariamente podemos acompanhar por telejornais, sites e até pessoalmente.
Mas, de que forma essa técnica pode começar a ser exercitada? Aqui vão algumas dicas:
- Conecte-se genuinamente durante cada conversa. A correria do dia a dia tende a nos tornar mecânicos.
- Evite comparações e julgamentos, sejam pessoais ou sobre terceiros, pois o ser humano tem certa tendência a aplicar pré-conceitos e tirar conclusões que bloqueiam uma percepção real de cada situação.
- Pratique a empatia. Coloque-se no lugar do outro antes de se pronunciar.
- Escute para entender e não apenas para responder. Isso pode nos aproximar de quem nos cerca.
- Seja sempre honesto, de forma polida e respeitosa.
- Identifique o fato gerador de cada conflito e tenha como objetivo resolver, e não ter razão.
Essa abordagem é uma ferramenta que pode e deve ser utilizada para melhorar o relacionamento entre as pessoas, fazer bom uso da comunicação, realizar conexões mais satisfatórias e, além disso, motivar e inspirar a cada troca realizada. Observando os pilares da CNV e a prática consciente desses conceitos, o resultado será de relações mais recíprocas, amistosas e compassivas.
*As opiniões aqui colocadas refletem minha opinião pessoal e não necessariamente a opinião da Compass UOL.